Grata contribuição de Alfredo Escande – discípulo
e biógrafo de Abel Carlevaro
(breve entrevista)
(breve entrevista)
(TP)
- A vigência de uma Escola de Abel Carlevaro já se encontra estabelecida e
materializada, com o ideal da técnica a favor da música, em termos gerais, mas -
mais especificamente - você tem notícia de algum escrito de Abel Carlevaro
dedicado diretamente às chamadas "técnicas estendidas"? Ou você presenciou
alguma aplicação de técnica dirigida, publicada ou não, mas destacada ao
repertório contemporâneo, experimental?
(AE) Carlevaro
tinha entre seus planos escrever um trabalho sobre os recursos técnicos
não-tradicionais, o que agora costuma ser chamado de "técnica
estendida". Certa vez, inclusive, começamos a escrever alguns esboços, mas
outras coisas mais urgentes desviaram-no desse objetivo e não chegou a cristaliza-lo.
Ele estava sempre explorando possibilidades sonoras diferentes, e muitas vezes presenciei demonstrações suas sobre as mais variadas
técnicas (tanto a sós em seu estúdio como durante vários cursos
internacionais). Além disso, uma profunda conversa sobre esses assuntos com
Maurice Ohana em Paris, em 1974, configurou-se em um trabalho que, em
realidade, foi feito a "duas cabeças e quatro mãos", que foi "Estelas"
(escrevi a história deste trabalho em conjunto com Ruben Seroussi, e isso faz
parte do meu livro sobre Carlevaro).
(TP)
Embora tenha já sido admitida a presença de dissonâncias, a criação de obras
como Cronomías e outras implica uma
mudança de paradigma na maneira de entender / sentir o violão, uma abertura a
novos pontos de vista, a partir da escuta tradicional para outra diversa, da técnica
já obtida para a estendida.
Como
aconteceu com Carlevaro? Teria sido por contato com colegas e obras ou podemos
falar de uma espécie de "espírito de época" dos anos 60/70 que o
motivou?
(AE) Acho que essas motivações em
Carlevaro, são anteriores ao tempo que você menciona: o contato com Villa-Lobos
na primeira metade dos anos 40 já começou a lhe “abrir a cabeça", e o
mesmo pode ser dito de seu contato com Ohana no final daquela década e com Santórsola
nos anos 60, e – o que é fundamental – seu próprio espírito inquieto e de
mentalidade aberta a busca e experimentação.
(TP)
Admitindo-se uma Escola de Carlevaro, em sentido estrito, as comparações são
inevitáveis ... Sor, Tarrega, os antigos métodos de tratadistas como Sanz ...
e todos com forte ligação com suas próprias composições, ou seja, fazer a
"escola" envolve fazer suas peças, executar seus estudos e obras.
Em
Carlevaro teríamos de fazer o mesmo? Devemos ir além de seus cadernos de
técnica? Assim, embora as comparações sejam de fato imperfeitas, a ideia é:
fazer só a sua técnica já esclarece e reduz os problemas, mas fazer a sua
escola no total ... técnica, exercícios e - acima de tudo - suas obras, aí sim há
o sentido da Escola de Carlevaro, no total?
(AE) Acho que o
sentido da escola criada por Carlevaro não pode esgotar-se em seus cadernos de
técnica. Não se compreende isso se não se vincular diretamente a uma concepção
estética do violão, concebida em termos reais (e facilmente perceptíveis quando
se escuta atentamente suas gravações) como uma "pequena orquestra". Os
cadernos de técnica são apenas uma ajuda para estabelecer as bases, para
adquirir os fundamentos mecânicos que podem conduzir a uma adequada aplicação
destes critérios estéticos. Só por eles mesmos, não têm nenhum valor (e podem até
resultar negativos: assim ele me disse, quase literalmente, quando falou da sua
urgência em escrever seu livro de
teoria: "Na Europa estão usando meus cadernos sem nenhuma ideia de
como fazê-lo e para que servem, e isso pode ser um desastre", me disse
ele, e concluiu: "Eu tenho que escrever o livro de teoria" e foi
então que me pediu ajuda para fazê-lo).
Para realmente
entrar na escola de Carlevaro é muito importante estudar e compreender
profundamente seus cinco livros de "Técnica Aplicada" (seus
"Masterclasses" sobre Sor, Villa-Lobos e Bach, publicados, e outro ainda
inédito sobre estudos de Carcassi).
Também é
importante estudar e entender a fundo – e compreender seus critérios de uso da
mão direita, sua busca por cores, etc. – a música criada por ele, e também
analisar profundamente a forma como digitou, arranjou e interpretou outros
autores e conseguir
entender as suas razões para ter feito como fez.
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