terça-feira, 28 de agosto de 2018

Brouwer 80' – Quaternaglia estreia obra de Leo Brouwer

Quaternaglia – Foto : Gal Opido 

 Formado pelos exímios violonistas Christian Dozza, Fabio Ramazzina, Thiago Abdalla e Sidney Molina, o renomado Quaternaglia (http://quaternaglia.com.br) acaba de estrear uma nova obra de Leo Brouwer, no festival do Centro Cultural Baía dos Vermelhos em Ilha Bela (SP) – foi a 4 de agosto.
 Fruto de uma encomenda do Quaternaglia a Brouwer, recebida em junho passado, o grupo tem agora um ano de exclusividade com a peça, sendo futuramente publicada pela Espiral Eterna Ediciones. A obra ¡Así era la Dancita Aquella! (Divertimento), em movimento único, integrará o novo CD do grupo e irá se somar às celebrações dos 80 anos de Leo Brouwer em 2019. A relação do Quaternaglia com o compositor cubano vem de longa data (veja detalhes em entrevista de Sidney  Molina à Revista Concerto http://www.concerto.com.br/noticias/musica-classica/quaternaglia-estreia-em-ilhabela-obra-do-compositor-leo-brouwer-leia) e é, sem dúvida, uma das pontes musicais de Brasil e Cuba.
 O novo CD desse grupo de câmara, que já completou 25 anos, terá, além de Brouwer, arranjos de obras de Leonard Bernstein e Astor Piazzolla (de uma obra original para quarteto de cordas) e mais uma gravação inédita – "Memorial para un regreso" – de Javier Farías (veja aqui o primoroso video da obra na GuitarCoop https://guitarcoop.com.br/en/).
Vamos agora conversar com Sidney Molina do Quaternaglia.


 Teresinha Prada (TP) – Sidney, 25 anos de Quaternaglia, existe receita para essa duração? Qual o segredo desse sucesso? O que deve ser fundamental nessa relação...
Sidney Molina (SM) – O primeiro segredo é a relação entre as pessoas, a vontade de tocar junto, de aprender com o outro, de ensaiar. Sempre acreditamos que a música de câmara pode ser uma das mais preciosas práticas musicais que existem, mas ela passa, para nós, por um trabalho tão minucioso e de tanto envolvimento quanto o do solo, e isso não se faz pensando apenas no palco: tem de haver afinidade, e mesmo amizade entre músicos que se propõem a construir um som único a partir de quatro corações. O segundo segredo é, claro, a própria atuação. O quarteto nunca parou de tocar, de gravar, de pensar novos projetos, de sonhar. É o que o mantém vivo...e jovem!

(TP) – A obra “Memorial para un regreso” especialmente dedicada a vocês pelo chileno Javier Farías (radicado em Washington D.C.) tem um forte viés com a literatura latino-americana. Explique um pouco sobre o autor e essa peça, como você a classifica em tendências contemporâneas… Outrossim, tive impressão pelas resultantes sonoras enlaçadas aos títulos do “Memorial...” que Farías quer reintegrar nosso passado (latino-americano) ao presente. Em tempos tão difíceis, uma obra como essa se posiciona a favor do diálogo, não? – fale um pouco a respeito.
(SM) – Você toca em um ponto fundamental, e acredito que tenham sido fatores como esses que determinaram a aproximação artística entre Javier Farías e Quaternaglia. Gostaria de enfatizar que nós (ainda) não nos conhecemos pessoalmente, a peça nasceu de uma troca de experiências exclusivamente artísticas, musicais (e também literárias), entre nós. Javier Farías venceu os principais concursos de composição para violão do mundo, tem recebido diversas encomendas e prestigiosas bolsas acadêmicas para composição de novas peças, e, embora ainda não muito conhecido no Brasil, ele tem muitas obras editadas e é bastante tocado pelos violonistas pelo mundo afora. Memorial para un regreso faz parte de seu projeto dedicado aos 6 escritores latino-americanos ganhadores do Prêmio Nobel de Literatura, do qual participam eminentes violonistas internacionais. A obra dedicada ao Quaternaglia tem 3 movimentos, com mais de 15 min de duração no total, e inspira-se em Pablo Neruda. Ao mesmo tempo em que tangenciam referências a questões atuais, os movimentos inspiram-se em passagens da vida de Neruda: “Brava mar” é a relação do poeta com o mar, especificamente com o Pacífico chileno próximo de Isla Negra, onde construiu sua casa e está enterrado; “España en el corazón” trata do papel do poeta como defensor dos direitos humanos, à ajuda pessoal que ofereceu a amigos (como Lorca) durante a Guerra Civil Espanhola, é uma música muito dolorida; e o título “Exilio”, do terceiro movimento, que fala por si, evoca a perseguição implacável a que o poeta foi vítima quando, nos anos 1940, era Senador da República pelo Partido Comunista Chileno.

 (TP) – Sidney, voltando a falar do Brouwer, vi em sua entrevista à Revista Concerto como você descreveu essa nova obra… os traços brouwerianos, mas fiquei curiosa pelo título – o tema remonta a memórias do compositor? Qual a história dela?
(SM) – A nossa relação com Brouwer, cultivada ao longo de muitos anos – em que gravamos suas peças originais para quarteto de violões em nosso primeiro CD, que passou pelo prêmio no Concurso Internacional de Havana, pela estreia no Brasil de seus dois concertos, pela nossa atuação solista sob a regência dele com diferentes orquestras aqui e no exterior, e que culmina com essa obra dedicada a nós teve sempre momentos bem-humorados. Para além da seriedade e rigor no trabalho, ele sempre é muito alegre nos momentos em que convivemos! Como estamos aqui numa mídia escrita, e com a admiração que tenho ao seu trabalho como violonista, professora, pesquisadora e jornalista, tomo a liberdade de transcrever, em primeira mão para este blog, no original em espanhol, o texto que ele mesmo nos enviou sobre o título da nova peça:

“En un Festival Leo Brouwer de Musica de Cámara elaboré una danza cubana que ya existia en mi Trio (de título Sones y Danzones) y le hice partes a un segundo cello y a una flauta para que dos excelentes solistas se divirtiesen un poco con el Brouwer Trio de Valencia, España. En uno de los ensayos traté de recordar el título de la contradanza de Manuel Saumell (s.XIX) que dio origen a uno de los movimientos de mi Trio, Cómo se llamaba la dancita aquella?... y uno de los músicos dijo con gracia: dancita? jaja...! Así nace este título para el divertimento compuesto para Quaternaglia en el que desarrollo formantes rítmicos similares. Algunas células podrían ser comunes a músicas de nuestra América, siempre decantado por lo africano llegado a estas tierras.
Leo Brouwer


(TP) – O Quaternaglia retorna a Havana então em março de 2019 para o Brouwer 80? Como está a agenda do grupo 2018-2019?
(SM) – Este ano está particularmente intenso para nós. Iniciou com turnê norte-americana e a estreia mundial do quinteto com piano Song of the Universal, a partir de poema de Walt Whitman, de Sérgio Molina, com o pianista James Dick. Seguiram-se a nossa estreia como solistas da Orquestra Filarmônica de Minas Gerais, na nova Sala Minas Gerais, apresentações na Sala Cecília Meireles (RJ), na série Cultura Artística no MuBE, Festival de Vermelhos, no novo SESC Avenida Paulista, de volta ao Rio de Janeiro no Auditório do BNDES, e a gravação do CD em meio a tudo isso... Ainda aguardamos várias confirmações importantes para 2019, e esperamos que seja um ano bem intenso também!

(TP) Grata pela colaboração! E pelo texto em primeira mão de Leo Brouwer!

Mais:
Verbete do Quaternaglia na Enciclopédia do Acervo Digital do Violão Brasileiro:


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Saiba mais sobre comemorações dos 80 anos de Brouwer aqui:
http://musicacontemporaneaparaviolao.blogspot.com/p/brouwer-80.html


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