Quaternaglia – Foto : Gal Opido |
Formado pelos exímios violonistas Christian Dozza, Fabio Ramazzina, Thiago Abdalla e Sidney Molina, o renomado Quaternaglia (http://quaternaglia.com.br) acaba de estrear uma nova obra de Leo Brouwer, no festival do Centro Cultural Baía dos Vermelhos em Ilha Bela (SP) – foi a 4 de agosto.
Fruto de uma encomenda do Quaternaglia a Brouwer,
recebida em junho passado, o grupo tem agora um ano de exclusividade com a
peça, sendo futuramente publicada pela Espiral Eterna Ediciones. A obra
¡Así era la Dancita Aquella! (Divertimento), em movimento único,
integrará o novo CD do grupo e irá se somar às celebrações dos 80 anos de Leo
Brouwer em 2019. A relação do Quaternaglia com o compositor cubano vem
de longa data (veja detalhes em entrevista de Sidney Molina à Revista
Concerto http://www.concerto.com.br/noticias/musica-classica/quaternaglia-estreia-em-ilhabela-obra-do-compositor-leo-brouwer-leia) e é, sem dúvida, uma das pontes musicais de Brasil e
Cuba.
O novo CD desse grupo de câmara, que já completou
25 anos, terá, além de Brouwer, arranjos de obras de Leonard Bernstein e Astor
Piazzolla (de uma obra original para quarteto de cordas) e mais uma gravação
inédita – "Memorial para un regreso" – de Javier Farías (veja
aqui o primoroso video da obra na GuitarCoop https://guitarcoop.com.br/en/).
Vamos agora conversar com Sidney Molina do Quaternaglia.
Teresinha Prada (TP) – Sidney, 25 anos de Quaternaglia, existe receita para essa duração? Qual o segredo desse sucesso? O que deve ser fundamental nessa relação...
Sidney Molina (SM) – O primeiro segredo é a relação entre
as pessoas, a vontade de tocar junto, de aprender com o outro, de ensaiar.
Sempre acreditamos que a música de câmara pode ser uma das mais preciosas
práticas musicais que existem, mas ela passa, para nós, por um trabalho tão
minucioso e de tanto envolvimento quanto o do solo, e isso não se faz pensando
apenas no palco: tem de haver afinidade, e mesmo amizade entre músicos que se
propõem a construir um som único a partir de quatro corações. O segundo segredo
é, claro, a própria atuação. O quarteto nunca parou de tocar, de gravar, de
pensar novos projetos, de sonhar. É o que o mantém vivo...e jovem!
(TP) – A obra “Memorial para un regreso”
especialmente dedicada a vocês pelo chileno Javier Farías (radicado em
Washington D.C.) tem um forte viés com a literatura latino-americana. Explique
um pouco sobre o autor e essa peça, como você a classifica em tendências
contemporâneas… Outrossim, tive impressão pelas resultantes sonoras enlaçadas
aos títulos do “Memorial...” que Farías quer reintegrar nosso passado
(latino-americano) ao presente. Em tempos tão difíceis, uma obra como essa se
posiciona a favor do diálogo, não? – fale um pouco a respeito.
(SM) – Você
toca em um ponto fundamental, e acredito que tenham sido fatores como esses que
determinaram a aproximação artística entre Javier Farías e Quaternaglia.
Gostaria de enfatizar que nós (ainda) não nos conhecemos pessoalmente, a peça
nasceu de uma troca de experiências exclusivamente artísticas, musicais (e
também literárias), entre nós. Javier Farías venceu os principais concursos de
composição para violão do mundo, tem recebido diversas encomendas e
prestigiosas bolsas acadêmicas para composição de novas peças, e, embora ainda
não muito conhecido no Brasil, ele tem muitas obras editadas e é bastante
tocado pelos violonistas pelo mundo afora. Memorial para un regreso faz parte de seu projeto dedicado aos 6
escritores latino-americanos ganhadores do Prêmio Nobel de Literatura, do qual
participam eminentes violonistas internacionais. A obra dedicada ao
Quaternaglia tem 3 movimentos, com mais de 15 min de duração no total, e inspira-se
em Pablo Neruda. Ao mesmo tempo em que tangenciam referências a questões
atuais, os movimentos inspiram-se em passagens da vida de Neruda: “Brava mar” é
a relação do poeta com o mar, especificamente com o Pacífico chileno próximo de
Isla Negra, onde construiu sua casa e está enterrado; “España en el corazón”
trata do papel do poeta como defensor dos direitos humanos, à ajuda pessoal que
ofereceu a amigos (como Lorca) durante a Guerra Civil Espanhola, é uma música
muito dolorida; e o título “Exilio”, do terceiro movimento, que fala por si, evoca
a perseguição implacável a que o poeta foi vítima quando, nos anos 1940, era
Senador da República pelo Partido Comunista Chileno.
(TP) – Sidney, voltando a falar do Brouwer, vi em sua entrevista à Revista Concerto como você
descreveu essa nova obra… os traços brouwerianos, mas fiquei curiosa pelo
título – o tema remonta a memórias do compositor? Qual a história dela?
(SM)
– A nossa relação com
Brouwer, cultivada ao longo de muitos anos – em que gravamos suas peças
originais para quarteto de violões em nosso primeiro CD, que passou pelo prêmio
no Concurso Internacional de Havana, pela estreia no Brasil de seus dois
concertos, pela nossa atuação solista sob a regência dele com diferentes
orquestras aqui e no exterior, e que culmina com essa obra dedicada a nós teve
sempre momentos bem-humorados. Para além da seriedade e rigor no trabalho, ele
sempre é muito alegre nos momentos em que convivemos! Como estamos aqui numa
mídia escrita, e com a admiração que tenho ao seu trabalho como violonista,
professora, pesquisadora e jornalista, tomo a liberdade de transcrever, em
primeira mão para este blog, no original em espanhol, o texto que ele mesmo nos
enviou sobre o título da nova peça:
“En un Festival Leo Brouwer de Musica de Cámara
elaboré una danza cubana que ya existia
en mi Trio (de título Sones
y Danzones) y le hice partes a un
segundo cello y a una flauta para que dos excelentes solistas se divirtiesen un poco con el Brouwer Trio de
Valencia, España. En uno de los ensayos traté de recordar el título de la
contradanza de Manuel Saumell (s.XIX)
que dio origen a uno de los movimientos de mi Trio, Cómo se llamaba la dancita aquella?...
y uno de los músicos dijo con gracia: dancita? jaja...! Así nace este
título para el divertimento compuesto
para Quaternaglia en el que desarrollo formantes rítmicos similares. Algunas
células podrían ser comunes a músicas de nuestra América, siempre decantado por
lo africano llegado a estas tierras.
Leo Brouwer”
(TP)
– O Quaternaglia retorna a Havana então em março de 2019 para o Brouwer
80? Como está a agenda do grupo 2018-2019?
(SM)
– Este
ano está particularmente intenso para nós. Iniciou com turnê norte-americana e
a estreia mundial do quinteto com piano Song of the Universal, a partir de
poema de Walt Whitman, de Sérgio Molina, com o pianista James Dick. Seguiram-se
a nossa estreia como solistas da Orquestra Filarmônica de Minas Gerais, na nova
Sala Minas Gerais, apresentações na Sala Cecília Meireles (RJ), na série
Cultura Artística no MuBE, Festival de Vermelhos, no novo SESC Avenida
Paulista, de volta ao Rio de Janeiro no Auditório do BNDES, e a gravação do CD
em meio a tudo isso... Ainda aguardamos várias confirmações importantes para
2019, e esperamos que seja um ano bem intenso também!
(TP)
Grata pela colaboração! E pelo texto em primeira mão de Leo Brouwer!
Mais:
Verbete do Quaternaglia na Enciclopédia do Acervo Digital do Violão Brasileiro:
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Saiba mais sobre comemorações dos 80 anos de Brouwer aqui:
http://musicacontemporaneaparaviolao.blogspot.com/p/brouwer-80.html
http://musicacontemporaneaparaviolao.blogspot.com/p/brouwer-80.html
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