quinta-feira, 13 de outubro de 2016

Parte 4 – Música Contemporânea para Violão em Livros... Humberto Amorim




...um fruto estrondoso da paixão, sutilmente marcada pelo destino,  entre Villa-Lobos e o violão.
(Humberto Amorim, 2009, p.132)


Heitor Villa-Lobos e o violão
Editora Academia Brasileira de Música, Rio de Janeiro, 2009
autor: Humberto Amorim


Humberto Amorim é violonista e professor na Universidade Federal do Rio de Janeiro, seu livro retrata a poética de Villa-Lobos, caminhando entre história e análise musical. Alguns destaques: o autor fez pesquisa em originais e mostrou ambiguidades em algumas datas de obras, além da abordagem da Valsa de Concerto 2 e Valse-Choro, ainda pouco exploradas na musicologia e na performance. Os índices onomástico e remissivo são de grande ajuda aos pesquisadores.

Os capítulos  seguem pela cronologia de Villa-Lobos, no entanto destacam personagens bem menos lembradas nas biografias do compositor carioca: Olga Praguer Coelho, Regino Sainz de la Maza e Abel Carlevaro.

No tópico dedicado às primeiras peças camerísticas, Amorim destaca o Sexteto Místico, obra de câmara de Villa-Lobos que inclui o violão. A vanguarda desta obra é estabelecida em relação às ideias musicais e o momento histórico, os modernos anos 20, inclusive datas são reexpostas (1917/1921). A reunião dos seis  instrumentos é rara (flauta, oboé, sax alto, harpa, celesta e violão),  confluindo para uma importância dada ao Timbre; no manuscrito datado de 1921 há outra ideia de formação, que incluiria cítara e coro masculino. Amorim considera que Villa-Lobos pode ter pensado em apresentá-la na Semana de 22. Nesta obra já há procedimentos marcantes do compositor, como a característica ideia musical por cordas soltas e o paralelismo no braço do violão.

Em Distribuição de Flores (1937 no Catálogo oficial, 1932 no manuscrito pesquisado pelo autor), obra modal para flauta e violão, Amorim destaca a ausência de fórmula de compasso e ideias musicais a partir da afinação natural do violão e das cordas soltas, e efeitos percussivos (tamboras).

Sobre a Valse-Choro, obra encontrada em 2005 pelo violonista franco-italiano Frédéric Zigante, Amorim esclarece vários pontos sobre sua concepção e afirma: “Valse-Choro é indiscutivelmente uma peça que tem efeitos e recursos violonísticos mais ousados, além de uma harmonia que explora mais intensamente as dissonâncias e os cromatismos” (AMORIM, 2009, p. 74), inclusive aponta alguns procedimentos inéditos em sua produção até esta data.

No capítulo 4, apropriadamente intitulado Paris – uma mudança, Amorim reitera o fato de Villa-Lobos estar em Paris e o que tal mudança de contexto fez a seu gesto poético. Além do aspecto de efervescência artística parisiense interagindo,  o autor elenca fatores que favoreceram o violão: a popularidade do instrumento em Paris; um ambiente favorável à brasilidade da obra villalobiana; e o contato com grandes nomes do violão mundial no século XX.  

As cartas de Andrés Segovia (a Villa-Lobos e a Ponce) são analisadas quase como o paradoxo entre serem coetâneos um violonista da categoria de Segovia e um compositor avant la lettre como Villa-Lobos e, no entanto, constatar-se a preterição de uma obra-prima como os Estudos por parte de Segovia.

Ainda nesse capítulo, Amorim faz considerações interessantes sobre obras curtas na produção total de Villa-Lobos, apontadas como as de “melhor resolução composicional” por outros analistas, entre os quais o grande Mário de Andrade, sendo isso também percebido na arquitetura dos 12 Estudos – uma genialidade concentrada em 12 pequenos compartimentos. A afirmação é bem embasada no texto do pesquisador com comparações a outras obras.

Entrando nos aspectos históricos dos Estudos, Amorim faz um inconteste tributo a Turíbio Santos, como o pioneiro absoluto nesse consagrado ciclo de obras: apresentação dos 12 Estudos em concerto;  gravação  da versão integral; autoria do primeiro livro (do qual ainda falaremos neste blog), entre outros maravilhosos feitos desse verdadeiro cavalheiro do violão brasileiro.

A partir daí, Amorim examina cada um  dos 12 Estudos, contemplando a técnica a que se dirige e a expressividade da escrita de Villa-Lobos – objetivo maior de sua pesquisa.

O capítulo 5 traz uma confluência histórica entre Villa-Lobos, Abel Carlevaro e os Cinco Prelúdios. Amorim aponta uma inteligência na exploração de recursos dos Prelúdios, inclusive com momentos de procedimentos inéditos – em considerações bem descritas. O livro termina com uma síntese de quase 50 itens identificados na escrita violonística villalobiana.  

Humberto Amorim tem uma visão bem equilibrada dos feitos de Villa-Lobos, sabendo discernir os dados coletados com a devida cautela acadêmica, inclusive reiterando a importância de Stravinsky e Varèse (p. 137) no contexto de parte da obra villalobiana. É difícil para qualquer violonista brasileiro se abster do privilégio de ter Villa-Lobos como ponto de referência na arte do violão de concerto, entretanto Amorim apresenta uma versão plural dos eventos que cruzaram o destino de Villa-Lobos em direção ao violão.

 
O livro de Amorim organiza muito bem as informações que estabelecem a produção violonística de Villa-Lobos como uma obra permanente para o violão de concerto em nível mundial.

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